Ela não parava de me olhar. Era
uma senhora de aproximadamente 50 anos, com o cabelo armado, penteado para o
lado, loiro escuro com mechas marrons, um par de grandes brincos de pérolas,
óculos de grau quase na ponta do nariz, um casaco preto de veludo, um cachecol
bonito, calça vermelha e um sapato horroroso, sentada no ônibus, enquanto
segurava o jornal na página das palavras cruzadas.
Quando me dei conta de que ela
estava me observando, com aqueles olhos castanhos saltando por cima dos óculos,
percebi que ela já estava fazendo isso há algum tempo. Sua feição de indagação,
com aquela testa franzida, típica de desenhos em quadrinhos, era muito
engraçada, mas era muito constrangedora ao mesmo tempo.
O ônibus começou a encher e um
garoto, estudante, provavelmente, já que estava de uniforme e uma grande
mochila, se posicionou na frente da tal mulher. Sua mochila ficou de uma forma
que bloqueou o olhar acusador que estava me incomodando. Até hoje acho que esse
garoto era um anjo, já que além de me proteger daqueles olhares, ele bloqueava
o sol, que estava na minha cara, com a aba do boné dele.
Quando o garoto finalmente desceu
do ônibus, percebi que a senhora já não estava mais lá, e que no lugar, havia
uma adolescente com seus 15 anos, no máximo. Era loira, tinha uma franja lisa e
o cabelo meio seco. Usava uniforme também, segurava no colo uma mochila da Hello Kitty e estava com um tênis muito
legal, que me deu inveja e vontade de perguntar onde eu poderia comprar igual.
Minutos depois de ter começado a
fantasiar um possível papo com a garota, percebo que ela começa a me olhar. Um
olhar estranho, mas que eu já conhecia. Era uma feição de indagação, com aquela
testa franzida, típica de desenhos em quadrinhos. Era engraçada e
constrangedora ao mesmo tempo, exatamente igual ao olhar da mulher que a
antecedera naquele mesmo lugar.
Nessa hora passei a mão no
cabelo, para saber se estava assanhado, passei um lenço no rosto, para limpar
qualquer possível mancha de creme dental, assoei o nariz, caso estivesse com
alguma meleca pendurada. Estava tudo em perfeito estado, como deveria estar.
Foi nessa hora que me dei conta
de que estava, desde que entrei naquele ônibus, ‘levando um lero by myself’ em inglês. E que aqueles
olhares, provavelmente, estariam indagando o conteúdo da minha conversa, que
estava muito boa, por sinal. Lembrei-me dos meus tempos no Brasil, quando eu
estava no lugar da senhorinha e da pirralha, olhando com cara de indagação, com
a testa franzida, típica de desenhos em quadrinhos, os outros loucos e
totalmente ‘forever alone’ que
conversam sozinhos no ônibus.
adoro seu blog, voce e muito inteligente!
ResponderExcluirMelhor jornalista de toronto!!!
ResponderExcluirassinado: descubra se puder!! hahahahah
Vou preservar sua identidade, mas pela letra, claro que eu sei quem é! :D
ExcluirObrigado pelo carinho!